Enquanto Rádios, Tvs, Jornais ocupam nossas mentes, com as histórias do traficante fuzilado na Indonésia, sobre as quais vemos reverberadas nos “faces da vida”….

Enquanto essa mesma mídia ocupa nossas mentes com as versões do recém ato de terrorismo na França, nos compelindo a mudar de “identidade” publicamente…

Trago algumas questões pra gente refletir. Sei que não são “novidades”, mas é que às vezes, periga  entrarem na conta do “ isso é natural, a gente já sabe, a gente não pode fazer nada…”. Mas será que a gente não pode fazer mais?

Passam ao largo em nosso Estado e de resto, no país, situações confrontadoras dos direitos humanos que exigiriam, estas sim, “pedidos de clemência” em seus mais largos significados (humanidade, bondade, comiseração), para um contingente enorme de mulheres, crianças e homens do semiárido, cujo destino se vê sem perspectivas diante da crueldade de um estado de calamidade há muito anunciado, mas até hoje vulgarmente tratado pelo poder público.

Levas de pessoas, que ainda sobrevivem com rasos vasos de água barrenta e podre, enquanto o novo governador do Ceará vai continuar entregando água à Térmica do Pecém, pela metade do preço.

Passam também ao largo, os índices cada vez mais alarmantes de violência doméstica e de exploração sexual contra crianças e adolescentes, naturalizados pelo machismo e pelo racismo.

Passa ao largo, o desrespeito, o des-reconhecimento e a des-valorização das mulheres como sujeitos do desenvolvimento, capazes de inferir e propor novos projetos de vida para a população. Basta uma leitura breve dos jornais, uma escuta nas entrevistas de rádio ( quem se pronuncia sobre o que), uma olhada nas publicações, nos parlamentos, no judiciário, nos secretariados do poder público…Basta atentar para quem vem “formando opinião” nesse país; quem compõe os “pactos”  e as reuniões “inventadas”, aqui mesmo no Ceará, por governo e Prefeitura, para buscar soluções para os problemas gerados pela violência, precarização da saúde, drogas…

Nesse mundo real, as mulheres não aparecem; não são vistas como “produtoras”, no clássico dilema entre produção e reprodução. Elas aparecem na ficção (novelas – uma imitação tosca do real) e nas propagandas, realizando o “trabalho reprodutivo”, para cumprir um papel: cristalizar o pensamento dominante construído, baseado no patriarcado e, nos tempos atuais, no novo espírito do capitalismo, que rechaça as qualidades e as capacidades das pessoas, corroendo seu caráter. Ou seja, reproduzindo as condições para que a opressão e a dominação continuem vingando.

E pasmem! Mesmo aquilo que diz respeito às políticas mais gerais de governo, cujo descaso vai atingir diretamente toda a população (refiro-me a mudanças estruturais), deixa-se passar ao largo, em troca de poucos dias de “liberação geral” embalados pelas “inesquecíveis marchinhas de carnaval” ou pelas baixarias do carnaval moderno. Ruas cheias, feito as “Diretas Já”, o “Fora Collor”, o “Passe Livre”….

Enquanto isso, o Ministro Levy, aquele egresso da Escola de Chicago* – prestadora de “relevantes serviços” ao império americano –  com passagens pelo FMI, Banco Interamericano e Banco Central Europeu, sacraliza um “pacote de maldades” que tem como principal objetivo fazer superávit primário para pagar os serviços de uma Dívida Externa que está hoje em U$ 440 bilhões e uma Dívida Interna que beira a R$ 3 trilhões.

Nesse pacote, estão medidas de arrocho e perda de direitos no que se refere à legislação trabalhista, à previdência, ao aumento da cobrança por serviços essenciais relacionados à energia, água, educação; aumento de impostos, sem falar em medidas que consolidam a marca neoliberal do atual governo, como por exemplo, o enterro definitivo da reforma agrária.

Todas elas são o cumprimento da promessa feita aos setores que vivem da super-exploração do trabalho e cuja aliança mantém a espoliação endêmica aos direitos individuais e coletivos, enerente ao capitalismo.

Para o Ministro, o mais importante nesse momento, é reconquistar a confiança dos agentes econômicos. Traduzindo: evitar que a Rede Globo e a Veja continuem batendo no governo.

É certo que houve avanços no governo Dilma, mas estes não podem ser usados para encobrir o problema crônico do país: o aprofundamento de um modelo de desenvolvimento que abdica de toda a sua riqueza (no sentido lato) para atender a uma estrutura de poder nacional (apenas 5 mil famílias num universo de mais de 51 milhões) e de poder global (banqueiros internacionais e instituições financeiras internacionais) e onde a concentração de riqueza e renda geram a impossibilidade de termos bens, serviços e equipamentos sociais de qualidade e em quantidade suficiente para toda a população.

Diante desse cenário, se é para publicizar um mito, um herói, “je ne suis pas Charlie; je suis Mário Gomes”*.

Magnólia Said, Advogada, membro da Rede Jubileu Sul Brasil e feminista

 *Surgiu nos EUA em 1910, por iniciativa de sociólogos americanos, especializados no estudo do que chamavam de “patologia social”: criminalidade, delinquência, gangues, pobreza, imigração, etc. Daí surgiram teorias e procedimentos metodológicos para tratar dessas questões, tanto nos EUA como em países que o governo americano queria dominar. Desde então, assume parcerias com Universidades de outros países, colocando profissionais de confiança em Ministérios-chave, para desestabilizar os governos, combinando neoliberalismo com destruição rápida das oposições.

*Poeta cearense Mário Gomes, morreu aos  67 anos, no dia 31/12/2014, pobre e largado. Conhecido com o “Poeta Descomunal”, o andarilho vagava pelas praças do centro de Fortaleza e pelos arredores do Centro Cultural Dragão do Mar, declamando poesias. Ele foi encontrado desacordado próximo ao Centro Dragão do Mar e levado em estado grave para o Hospital, não resistindo.

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